domingo, 18 de setembro de 2011

Sobre o Ganhar Mundo

Aqui está uma expressão de que muito gosto e que uso várias vezes. Penso que sentimos quando estamos junto de alguém que já "ganhou muito mundo" e daqueles que nunca sairam do seu quarteirão. E o famoso ganhar mundo não se faz apenas em termos fisicos, em calcorrear tudo quanto é canto. Ganha mundo quem não tem medo de arriscar, quem tem sempre vontade de conhecer vêr ou fazer coisas novas. Uns levam mais tempo a ganhar mundo do que outros, mas mesmo quando sentimos que alguém está mais atrasado pudemos sempre ajudar, desde que tenham lá o potêncial. Parece que estou aqui a escrever como se já tivesse ganho muito mundo, mas tudo é relativo, em comparação a alguns tenho mais mundo do que me parece que eles algum dia vão ter e em relação a outros parece que nem nunca sai da casca. Normalmente sempre me desenvolvi na companhia dos namorados que tive. Aprendi sobre motas e carros, sobre vinhos e literatura, sobre saber visitar atentamente um museu ou descobrir Lisboa. Eu também lhes dei outras coisas, mas houve sempre uma simbiose porque acreditavamos que valia a pena, que o outro tinha potêncial para isso. Este ano aprendi muito com os novos amigos que fiz. A titulo de exemplo na próxima semana vou começar a ler um livro que nem sei bem se a designação que lhe dão é a de policial, do autor da trilogia millenium. Nunca pensei ler um autor sueco que escreve romances policiais, mas graças aos meus amigos ganhei mais esse pedacinho de mundo para mim. Isto tudo para chegar onde? Num post que o arrumadinho escreveu sobre o facto de amarmos quem admiramos (é certo) mas de tendêncialmente admirar quem tem mais mundo. Antes de terminar este post vou deixar ficar o texto a que me refiro. Embora eu entenda a ideia há uma coisa que já aprendi. Quando nos enamoramos de alguém é muito fácil chegar lá pelas afinidades e pelo estilo de vida em comum. Mas vamos lá ver... as afinidades ganham-se e perdem-se ao final do dia e um estilo de vida semelhante é só manter o que já existe e não criar nada de novo. Com uma existência muito "vivida" que a tenho tido, com uma série de experiências e de amores aprendi a valorizar outras coisas. Se antigamente eu dizia que as caracteristicas que mais gostava num homem seriam a inteligencia e o sentido de humor, hoje em dia já não é bem assim. É que já perdi a conta aos homens inteligentes e com um sentido de humor fantástico e que me fizeram comer o pão que o diabo amassou, com o seu egoismo, egocentrismo e falta de capacidade de dar. Percebi que me agradavam mais os homens bondosos e de franca integridade e até agora não tenho estado errada. E também esses, mesmo quando não são tão deslumbrantes e com um mundo tão brilhante quanto os outros, podem ganhar mundo com a nossa ajuda. Desde que tenham lá esse potencial e nós tenhamos essa dedicação para com eles.
Sobre o post do arrumadinho? Posso dizer que hoje é mais fácil amar alguém integro, sensivel e bondoso, do que alguém inteligente, super culto e com um mundo para lá de interessante.

Eu admiro pessoas com mundo, gente com experiências para contar, coisas interessantes para partilhar, com dimensão e conhecimento. Chega-se lá não atirando anos de vida para o lixo, como muita gente faz. E aqui falo de homens e mulheres. Pessoas que chegam a Dezembro, com as 12 passas na mão, olham para trás e percebem que mais um ano passou e não fizeram nada de verdadeiramente relevante que os tornasse melhores pessoas. Não leram quase nada, não viajaram quase nada, viram um ou outro filme que passou na TVI, nem sequer se preocuparam muito em ser felizes, não estiveram com amigos, não se inscreveram naquele curso que parecia interessante, não se esforçaram por entender o porquê de estarmos em crise, estiveram-se nas tintas para a Líbia, não leram um jornal. Limitaram-se a deixar passar o tempo ao sabor de uma rotina confortável que os levou até ali, às 12 passas na mão, em cima de uma cadeira, cuecas azuis vestidas e um sentimento de "para o ano é que é — vou ler dois livros por mês, vou fazer aquela viagem a Itália, vou para o ginásio perder esta barriga, vou sair mais com os amigos, vou mudar a disposição da sala, vou encontrar a pessoa certa para mim e vou voltar a estudar". Geralmente aí a 3 de Janeiro, 28 rabanadas no bucho depois, começam a dizer que o ginásio pode ficar para o mês seguinte, para começarem logo dia 1, não começam o livro de 688 páginas que receberam no Natal porque nessa noite há um "especial Meu Amor", com três episódios de seguida, não vão ao cinema porque está frio, não vão ao teatro porque é chato, percebem que para voltar a estudar o melhor é inscreverem-se só em Setembro, e deixam os planos de férias para depois, até porque se calhar o melhor é mesmo ir pela sétima vez à República Dominicana, onde a água é quentinha e pode comer-se o dia inteiro.

Muitas pessoas gostam de pensar que não fazem nenhuma destas coisas por falta de dinheiro. Há casos em que acredito que sim, que o dinheiro é o travão, principalmente a partir de certa idade, quando passamos a ter maiores responsabilidades, com contas para pagar e filhos para sustentar. Mas o problema não é termos chegado aos 30 ou 35 anos e não termos dinheiro para ir conhecer mundo. O problema é termos chegado a essa idade e olharmos para trás e vermos um vazio imenso que podia ter sido preenchido de mil e uma maneiras mais ricas. Toda a gente se queixa de falta de dinheiro, mas chega-se ao Natal, ao Carnaval, à Páscoa e ao Verão e esgotam os bilhetes para as Caraíbas, e o Algarve está lotado. Afinal, parece que sempre há algum dinheiro. Mas em vez de procurarem fazer coisas novas, ganhar mundo, muita gente procura criar novas rotinas — agora de férias — tentando uma vez mais não sair da sua zona de conforto, repetindo as fórmulas de sempre, que ao menos são seguras.


A dimensão humana que se ganha com uma vida preenchida ajuda a tornar-nos admiráveis. Não estou a dizer que as pessoas mais viajadas são todas boas pessoas. Não é nada disso. O que sei é que quando se ganha mundo, quando se conhecem outras pessoas, outras realidades, quando se percebe o que é, de facto, a miséria, a tristeza, quando vemos gente ser feliz com tão menos do que nós temos, isso tudo quase que nos obriga a reflectir sobre a nossa própria existência, sobre as nossas opções, e dessa reflexão, acredito, nasce uma força que nos torna melhores.
Nunca é tarde para se começar esse processo. Basta querer-se. E quando queremos muito, conseguimos. O mais difícil é mesmo vencer a inércia (ou a preguiça) que nos trava o primeiro passo. O que nos torna mais ricos não é o destino final, porque esse não existe, mas sim o caminho que fazemos até lá.

Sem comentários: